Há mais de uma década o pagamento por celular é apontado como uma grande tendência tecnológica. Fazemos tudo pelo celular. Por que não usá-lo para pagamentos? Na prática, a tendência tropeça numa série de fatores. Há conflito de interesse entre empresas de tecnologia e instituições financeiras. Quem vai pagar pela transação? Como as taxas serão divididas? Por que um banco, que pode criar sua própria ferramenta de pagamento, vai se curvar a uma ferramenta tecnológica de um terceiro? Bom, a Samsung afirma que conseguiu costurar todos esses interesses, e que seu sistema de pagamento móvel deve estrear no Brasil nos próximos meses. O anúncio foi feito na Mobile World Congress, feira de tecnologia que acontece esta semana em Barcelona.
O sistema se chama Samsung Pay. O usuário cadastra os cartões do banco no aplicativo e aproxima o celular de máquinas leitoras em lojas ou quaisquer estabelecimentos comerciais. Um sistema de criptografia garante a segurança das transações. Para nós, usuários, o sistema promete comodidade -- poder sair sem carteira de casa e fazer pagamentos como se estivéssemos com o cartão ou com dinheiro no bolso.
A novidade, se ocorrer como previsto, não é apenas mais um lançamento da empresa coreana. Ela pode significar o início de uma grande mudança na forma como fazemos nossos pagamentos no Brasil.
A Samsung não deu detalhes de como fechou os acordos necessários. Mas, a exemplo da Apple nos Estados Unidos, convenceu diversas grandes empresas brasileiras a aceitar sua tecnologia. São oito, por enquanto: Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Porto Seguro, Santander, Brasil Pré-Pagos e Nubank. Segundo a empresa coreana, essas instituições respondem por 90% do mercado financeiro do país.
Além dos interesses às vezes divergentes, havia uma barreira tecnológica. De todas as tecnologias que surgiram ao longo da última década, nenhuma tornava o ato de pagar muito mais eficiente que o uso do cartão. "Enquanto passar o cartão na máquina e digitar a senha for mais fácil do que abrir o celular e percorrer um longo caminho até o fim da transação, o pagamento móvel não irá avançar", disse-me uma vez Sucharita Mulpuru, vice-presidente da Forrester, uma consultoria especializada em tecnologia.
A Samsung parece ter resolvido isso. Havia uma grande discussão sobre qual padrão seria adotado para o pagamento móvel. No papel, o NFC (sigla em inglês para Comunicação por Campo Próximo), mostrava-se a melhor solução. Com ela, bastava aproximar dois dispositivos com um chip NFC para realizar a transação. Poderia ser entre o smartphone e uma máquina de cartões, ou mesmo entre dois smartphones. Mas o NFC prometeu e não cumpriu. Apesar de estar presente em alguns smartphones mais avançados, não havia uma base grande de máquinas leitoras no varejo. A solução da Samsung foi comprar uma empresa em 2014 chamada Loop Pay. Ela desenvolveu um sistema de pagamento por celular que usa uma tecnologia presente em máquinas mais antigas, com leitores de cartão magnético. Perfeito para mercados como o brasileiro.
O terceiro e último fator seria ter uma base de smartphones que justificasse o investimento num sistema de pagamentos móveis. A Samsung é a maior vendedora de celulares no mundo. Assim, consegue começar um serviço com um número significativo de usuários. Se o serviço funcionar direito, pessoas que não usam smartphones da Samsung podem se interessar por aparelhos da coreana. Isso fará com que outras empresas corram para lançar sistemas concorrentes no Brasil. Nos Estados Unidos, Apple, Google, Groupon e Paypal têm serviços de pagamento móvel similares.
A Samsung ainda diz que está em estudo a integração de sua carteira móvel com serviços de transporte público, como o Bilhete Único de São Paulo. E também para carregar documentos, como CPF e carteira de motorista. Parece que, finalmente, a carteira começa a trilhar o caminho para se tornar peça de museu.
Fonte: Época
Data: 24/02/2016